Abril vive<br>Abril viverá

«Porque todo o tempo é de Abril, quando de luta é feito o tempo que vi­vemos»

Come­mo­ramos esta se­mana os 40 anos desse acon­te­ci­mento maior da nossa his­tória, o 25 de Abril de 1974. Dia em que um le­van­ta­mento mi­litar logo se­guido de um le­van­ta­mento po­pular, cul­mi­nando uma pro­lon­gada e he­roica luta an­ti­fas­cista, pu­nham fim à mais longa di­ta­dura fas­cista da Eu­ropa. 48 anos de terror que to­lheram o de­sen­vol­vi­mento do País, com­pro­me­teram a nossa so­be­rania e in­de­pen­dência na­ci­o­nais, co­lo­caram as ala­vancas da nossa eco­nomia nas mãos de grandes mo­no­po­listas e la­ti­fun­diá­rios, foram res­pon­sá­veis por uma das mai­ores vagas de emi­gração da nossa his­tória, con­du­ziram a uma guerra co­lo­nial em três frentes com muitos mi­lhares de mortos e fe­ridos dos dois lados, dei­xaram um imenso rasto de mi­séria, atraso, obs­cu­ran­tismo e iso­la­mento.

Vá­rios fac­tores fun­da­men­tais in­ter­vi­eram nesta vi­ragem, como re­co­nhecia Álvaro Cu­nhal, em en­tre­vista a L'Hu­ma­nité em 29.04.1974: «a crise in­terna do re­gime fas­cista, as con­sequên­cias eco­nó­micas, so­ciais e po­lí­ticas da guerra co­lo­nial, o iso­la­mento e con­de­nação in­ter­na­ci­onal do fas­cismo e do co­lo­ni­a­lismo por­tu­guês, os êxitos dos mo­vi­mentos de li­ber­tação na Guiné-Bissau, em Mo­çam­bique e An­gola e o grande as­censo da luta do povo por­tu­guês».

Glo­riosa data em que um povo, que muitos di­ziam des­po­li­ti­zado, apá­tico e con­for­mado, in­vadia as ruas e os campos, e, lado a lado com os mi­li­tares do MFA, ca­vava a se­pul­tura ao fas­cismo. Com ambos, lá es­tava, com des­ta­cado papel e em pro­funda li­gação às massas, o Par­tido da re­sis­tência an­ti­fas­cista, o Par­tido da classe ope­rária, de todos os tra­ba­lha­dores, o Par­tido Co­mu­nista Por­tu­guês, par­ti­lhando a imensa ale­gria pela li­ber­dade du­ra­mente con­quis­tada e, ao mesmo tempo, or­ga­ni­zando, logo ali, a luta pelas mu­danças ne­ces­sá­rias, pre­ve­nindo para os pe­rigos à es­preita, ape­lando à uni­dade dos de­mo­cratas, or­ga­ni­zando as massas para os novos com­bates, con­tri­buindo para a ali­ança Povo-MFA, con­so­li­dando as con­quistas re­vo­lu­ci­o­ná­rias, pro­jec­tando os va­lores de Abril.

Uma se­mana de­pois, as gi­gan­tescas ma­ni­fes­ta­ções uni­tá­rias do 1.º de Maio con­fir­ma­riam o rumo re­vo­lu­ci­o­nário das trans­for­ma­ções que vi­riam a mudar a face do País: ins­tau­ração do re­gime de­mo­crá­tico, das li­ber­dades de­mo­crá­ticas fun­da­men­tais e dos di­reitos bá­sicos dos ci­da­dãos, na­ci­o­na­li­za­ções, re­forma agrária, con­trolo ope­rário, me­lho­ra­mento das con­di­ções de vida do povo, fim da guerra co­lo­nial e re­co­nhe­ci­mento do di­reito à in­de­pen­dência aos povos co­lo­ni­zados, li­ber­tação dos presos po­lí­ticos, so­be­rania po­pular, poder local de­mo­crá­tico, fim do iso­la­mento in­ter­na­ci­onal e adopção de uma po­lí­tica de paz, co­o­pe­ração e ami­zade com todos os povos do mundo, afir­mação da so­be­rania e in­de­pen­dência na­ci­o­nais – são al­gumas das con­quistas e va­lores que a Re­vo­lução de Abril en­raizou na so­ci­e­dade Por­tu­guesa e ca­ta­pultou para o fu­turo de Por­tugal.

Ini­ciado o pro­cesso contra-re­vo­lu­ci­o­nário em 1976 com o I Go­verno Cons­ti­tu­ci­onal (PS/​Mário So­ares), du­rante 37 anos de po­lí­tica de di­reita, o pro­cesso de re­cu­pe­ração ca­pi­ta­lista, pro­fun­da­mente ace­le­rado pela nossa en­trada na CEE/​UE, pro­curou re­cons­ti­tuir o edi­fício eco­nó­mico que os mo­no­pó­lios ha­viam per­dido na vi­ragem re­vo­lu­ci­o­nária de Abril.

Ao mesmo tempo, le­vantou-se uma vi­go­rosa acção de massas na re­sis­tência a esta po­lí­tica de re­tro­cesso, se­meada por um nú­mero in­con­tável de lutas (in­cluindo 10 greves ge­rais) tra­vadas pelos tra­ba­lha­dores e as massas po­pu­lares or­ga­ni­zadas pelo po­de­roso mo­vi­mento sin­dical da CGTP-IN e por ou­tras es­tru­turas uni­tá­rias. De novo e sempre com as massas tra­ba­lha­doras, lá es­teve o PCP, força po­lí­tica or­ga­ni­zada e or­ga­ni­za­dora. E com o PCP, a CDU (an­te­ce­dida pela APU e pela FEPU), num com­bate in­can­sável, ao longo destes 37 anos, que apesar das enormes perdas e re­tro­cessos, im­pediu que os par­tidos da po­lí­tica de di­reita – PS, PSD e CDS-PP – con­se­guissem, até hoje, a total re­cons­ti­tuição do velho poder per­dido.

E muito menos con­se­guiram (ou vão con­se­guir) apagar os va­lores de Abril.

Por­tugal é hoje uma re­pú­blica que, apesar de li­mi­tada na sua so­be­rania, tem uma Cons­ti­tuição que re­flecte grande parte desses va­lores. Im­porta de­fendê-la. Im­porta con­ti­nuar a luta nas em­presas, lo­cais de tra­balho e nas ruas bem como nos ór­gãos do poder e junto deles. Im­porta pros­se­guir a luta ide­o­ló­gica e o es­cla­re­ci­mento para a pró­xima ba­talha elei­toral.

40 anos são vol­vidos sobre o 25 de Abril de 1974. Muitas das con­quistas su­cum­biram à ofen­siva do grande ca­pital. O Por­tugal de Abril é hoje quase ir­re­co­nhe­cível no quadro de de­sastre eco­nó­mico, po­lí­tico, so­cial e cul­tural para que as po­lí­ticas de di­reita ar­ras­taram o País. Mas os va­lores de Abril ga­nharam raízes fundas na so­ci­e­dade por­tu­guesa. E Abril vive e vi­verá porque a luta do povo por­tu­guês con­tinua pela rup­tura com a po­lí­tica de di­reita, por uma po­lí­tica pa­trió­tica e de es­querda, pela de­mo­cracia avan­çada, pela so­ci­e­dade so­ci­a­lista que a Cons­ti­tuição, apesar de mu­ti­lada, con­tinua a con­sa­grar.

Hoje, como antes do 25 de Abril, há quem con­si­dere o povo por­tu­guês des­po­li­ti­zado, apá­tico e con­for­mado. Mas a ver­dade é que, apesar de tantas di­fi­cul­dades, não deixou cair os braços. Tem os olhos na Re­vo­lução de Abril cujas marcas e va­lores são se­mentes de fu­turo.

Por isso mesmo vai marcar pre­sença nas co­me­mo­ra­ções do 25 de Abril, do 1.º de Maio e nas lutas que virão. Sem es­quecer a grande jor­nada de 25 de Maio, re­for­çando, pelo voto, a CDU.

Porque todo o tempo é de Abril, quando de luta é feito o tempo que vi­vemos.